segunda-feira, 23 de abril de 2012

O SOM DO SILÊNCIO


Meu gato Kaká, que anda na contra-mão da cultura felina brasiliense, me acorda por volta das 5 e meia da manhã, pedindo para sair.  Faço uma horinha para aproximar sua saída da hora do amanhecer: vou ao banheiro, tomo água e quando finalmente abro a janela e volto para a cama, lá se foi o sono!  Costumo ligar o rádio baixinho porque isso me ajuda a achar o sono novamente.

Numa dessas noites, localizei um programa leve e divertido, comandado por um locutor que parece ter nascido falando no rádio, que achei ideal para me ajudar a relaxar; e assim passei a ser uma ouvinte assídua do show de Ronie Magrini, na rádio Itacolomi (94,1 FM). Na madrugada de sábado, estava ouvindo o programa, quando um homem ligou, pedindo uma música para dedicar à sua esposa.  O homem em questão disse trabalhar como vigia noturno de um convento e contou que viaja 3 horas para retornar ao lar.  Disse também que a esposa estaria ouvindo em casa e que ela adora a música pedida.

Ouvindo aquele trabalhador que falava com voz animada, pensei que sua vida não deve ser fácil: um trabalho noturno e longínquo, onde deve ganhar apenas um salário mínimo, talvez faça bicos durante o dia para ajudar no orçamento.  Mas ele acha dentro de si a delicadeza suficiente para oferecer músicas à sua esposa por meio de um programa de rádio.  Uma música de Simon and Garfunkel, linda e suave: The sound of silence.

Na minha cama confortável, ouvindo a bela música que aquele desconhecido me oferecera sem saber, fiquei pensando naquele homem que sairia do trabalho, ainda sonolento, e tomaria um ou mais ônibus em direção aos braços da esposa, para o calor da família humilde, mas rica em amor e dedicação mútua.

Agradeci em silencio e, com o coração cheio de esperança, adormeci.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Cadê o pitoco?

O video-teipe da novela vinha de avião e a gente assistia ao capítulo do dia anterior.  Tia Nezinha chegava do Rio de Janeiro e contava o capítulo inteiro, exibindo-se com sua  "sapiência" e estragando a nossa surpresa.   Mesmo assim, era muito bom ver TV, e saboreávamos cada novidade.  A programação começava às 17h00 com desenhos e seriados infanto-juvenis, á noite vinham as novelas e os telejornais.  Um dia, perdeu-se o pitoco: nada de novela.  Silêncio.  Em tempos muito anteriores ao controle remoto, era imprescindível a presença do pitoco para ligar o televisor. E sem a TV nossas noites eram tristíssimas.  O rádio, que antes nos distraia, agora era um mensageiro de tristeza, com sua total ausência de imagens: apenas o som e a imaginação, que já não sabíamos usar.

Achem o pitoco e mando consertar o televisor, decretou papai!  Era preciso achar o pitoco e Santo Antônio veio em nosso socorro.  Mamãe fez uma oração que sua avó lhe ensinara e sonhou, vendo, com nitidez, onde estava escondido o tão desejado pitoco. No dia seguinte, acordou ansiosa e foi direto no jarrinho do sonho.  Lá dentro, bem no fundo, repousava o pitoco.  Foi uma festa!  Chamado o técnico, instalado o pitoco,  voltamos a nos deliciar com Jeannie é um Gênio, A feiticeira, Irmãos Coragem e outra atrações.

Bons tempos aqueles, em que um simples pitoco era a diferença entra a alegria e a dor...

Lembrei-me dessa história da infância, passeando com minhas amigas Rosa e Régia em Olinda,quando lembramos do pitoco, palavra mais pernambucana não há.  Esse texto é minha singela homenagem para as queridas RR.

Ana Cecília