quinta-feira, 18 de outubro de 2012

POR QUE NÃO ADOTAR UMA CRIANÇA?



Já estive entre as pessoas que perguntam, ao ver alguém muito amoroso com seu animal: porque não adotar uma criança?
Mas, eu falava assim quando não sabia o significado de nenhuma das 2 coisas.  Agora  que sei, porque vivo essas experiências, sinto-me capaz de falar sobre o assunto. 
Ana Cecília e Agnaldo Barbosa de Araujo
Adotei Agnaldo há 22 anos e, há apenas 3, adotei Fefê e KK, dois gatinhos lindos e amorosos, pelos quais me apaixonei perdidamente.  Meu filho Agnaldo tem agora 25 anos e é meu grande amor.  Ele é um rapaz generoso, inteligente, alegre e cheio de vida.  Depois de Fefê e KK, chegaram Tita, Mila e seus filhotes enquanto crescia em mim o desejo de proteger esses bichinhos. 
Federica Felina Barbosa de Araujo- Fefê





Afinal, qual seria a diferença entre adotar uma criança e adotar um bichinho?   E quais as semelhanças?  As primeiras semelhanças que me vêm a cabeça são: amor e abnegação, sendo que o primeiro leva à segunda.  Ao adotar, a gente renuncia, por exemplo, ao direito de fechar a porta e viajar sem deixar para trás um ser vivo que depende de nós. 

Falando em ausências, a pessoa para tomar conta do filho é muito mais cara do que a babá do animal, o que nos leva a um aspecto prático inquestionável: adotar uma criança custa muito mais do que adotar um bichinho.  Bichinhos não estudam, não fazem atividade física, não freqüentam o curso de inglês, não compram roupas de marca, não viajam, não vão a parques de diversão. Bichinhos não escolhem comidas diferentes, não frequentam restaurantes e, em sua maioria, não vão às festinhas de aniversário dos amiguinhos.  Bichinhos só consomem ração, água e carinho.  No meu caso, que tenho gatos, nem pago pet shop, porque eles fazem sozinhos a sua toilete.
Um filhotinho que aguarda um lar

Pode-se dizer que, em compensação, ter animais não traz tanto prazer quanto ter filhos.  É nesse momento que pisaremos em um terreno ainda mais delicado, porque não quero defender uma coisa nem outra, o que me traz aqui é dizer, na minha opinião, porque  a pergunta: “por que não adotar uma criança em vez de criar um animal?” é tão inadequada.
Kairós* Barbosa de Araujo - KK


Animais são eternas crianças, enquanto a criança se transformará num adulto e o adulto será diferente do que se imaginou.
Tenho uma amiga que é filha única e perdeu a mãe.  Minha amiga já estava perto dos 40 anos quando a mãe morreu, era solteira e não tinha filhos.  Assim, começou a pensar em adotar uma criança. Pensou, pensou e adotou um lindo filhote de Lhasa Apso.  Ela explica: “estou perto dos 40 e não tenho mãe nem irmãos. Meus tios e tias são idosos. Com quem ficaria a criança caso algo me acontecesse? Também adoro viajar e descobri que desejava apenas uma companhia. Assim, um cachorro me atende”. Débora** está certa.  Para adotar crianças, é preciso ter certeza de que o principal desejo é ter um filho, o resto vem a reboque.  Não basta querer companhia, ou ajudar alguém.  Para que seja uma experiência de felicidade, tem que querer ter um filho e estar muito consciente de todas as implicações desse fato: boas e más. Isso porque o filho adotivo é igualzinho ao filho parido: uma pessoa com suas particularidades.  Alguém que vai te desagradar de vez em quando, talvez te decepcionar. Alguém que não vai querer seguir o projeto que foi construído para ele. 
Agnaldo Moita,  um DJ Bastante requisitado
 

Lembro-me de quando fui buscar Agnaldo na escola pela primeira vez.  Ele tinha 6/7 anos e o colégio era o mesmo em que eu havia estudado, três ou quatro prédios no meio de um enorme terreno.  Quando o portão do Infantil se abriu, o pequeno disparou a correr.  Eu, cansadíssima do trabalho, não consegui acompanhá-lo.  Chamei, pedi que parasse e ele, nada.  Enquanto tentava localizar a cabecinha loura lá na frente, entre os outros garotos com fardas e alturas iguais, meus olhos se encheram de lágrimas.   No táxi, a caminho de casa, perguntei-me o motivo do choro e descobri: era apenas decepção.  Eu sonhara com aquelas lindas cenas que vemos nos filmes em que a criança corre para a mãe, os dois se dão as mãos e saem conversando sobre o dia.  E a cena do sonho era muito diferente da vida real por um único motivo: meu filho era um menino cheio de energia, que, após um dia trancado numa sala de aula, só queria saber de correr.
Durante a vida, surgirão outros momentos assim, mais e menos intensos.  Coisas da vida de quem é mãe e pai.

Adotar uma criança, enfim, exige assumir uma responsabilidade muito maior, em todos os aspectos, do que adotar um bichinho, mas ambos trazem grandes recompensas.  É bom lembrar, também, que uma coisa não exclui a outra. Bichinhos são bichinhos, pessoas são pessoas.  E, se você tiver o coração tão grande que caiba os dois, por que não?

O Psiquiatra austríaco Vitor Frankl, tem como idéia central de sua teoria o sentido de realização, que pode ser dado apenas pelo amor.  Segundo Frankl, o amor liberta o homerm de sua prisão externa e interna, indo em direção àquilo que o torna maior que ele mesmo. Ele diz que o homem pode sentir-se realizado apenas quando sai de si e caminha em direção do outro.  Estou certa de que, se pudesse lhe perguntar, ele diria que esse "outro" pode ser uma pessoa ou um animal.
 


* Kairós significa "Tempo das oportunidades" 
** Nome fictício
  
Ana Cecília e Agnaldo, após uma apresentação no Teatro Nacional.

5 comentários:

  1. Ana,
    Obrigada por compartilhar seus sentimentos e ideias. Beijo
    Lidu

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  2. Lindo, Ana. Muito tocante e sincero, lendo, parece que estou te ouvindo falar. Parabéns pelo blog e pela crônica. Um beijo grande e carinhoso. Lu

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  3. Ceci Querida,

    Você é de uma delicadeza ímpar!

    Fátima

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    1. Grata, comadre, seus comentários são sempre muito preciosos, importantes pra mim.

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